sábado, 27 de julho de 2013

HARDWARE E SOFTWARE (O Dilema de Ser Brasileiro)


Está no nosso DNA ser patrimonialista. Já comentei aqui no blog que o brasileiro gosta de patrimônio, de ativo fixo. Ou seja, focamos muito no hardware e esquecemos que existe o software, aquilo que faz o hardware ganhar vida, se mexer. No senso amplo, o software são as pessoas que operam as máquinas.
As duas histórias a seguir são bem recentes e entre a tristeza e o tremendamente hilariante. A hilária é digna do Monty Python e imagino ela representada por John Cleese e Michael Palin.
A Tragicomédia
A primeira, a história tragicômica, começou com um pedido de ajuda de um amigo de infância, por e-mail, sobre o problema dele com a Receita Federal. Ele tinha que fazer uma declaração retificadora e o programa da receita teimava em não baixar. Era o programa que ajuda a emitir o DARF, pois ele tinha que fazer um recolhimento adicional. Falei para ele ir a um posto da Receita, para tentar resolver o assunto. Era terça feira, semana meio morna com os feriados papais, e ele ao chegar no posto, foi informado por quem o atendeu, que era melhor ele ir ao Centro da Cidade, para resolver por lá, no prédio do Ministério da Fazenda. O meu amigo chiou, rodou a baiana, e uma alma caridosa falou para ele que iria atende-lo. Mas... a máquina de emitir senhas estava quebrada, e depois de muitas conversas, emitiram uma senha a mão – tragicomédia, não acham?
Pelo menos, meu amigo saiu mais ou menos satisfeito com o atendimento. Mas reparem que software, neste caso os funcionários do posto da Receita, estão mal treinados sobre o que é um funcionário público. Precisou do amigo mandar uma bronca e um outro funcionário atende-lo, como se fosse um favor pessoal. Falha do software. E o hardware da Receita, volta e meia implica com o pessoal que usa Mac, e adota o browser Safari. Aliás, um monte de banco também implica com o Safari e insiste que você use Firefox. E por que, já que o Safari já vem com o Mac?
O Puro Non-sense do Monty Python
Um outro grande amigo é um advogado, que me contou uma doideira digna dos cômicos britânicos já citados, do qual sou um grande fã. Ele estava com um processo na área trabalhista e sabedor que o TRT do Rio implantou recentemente o processo eletrônico, resolveu experimentar a coisa.
Esclareço o que é um processo eletrônico, para os que não são da área. O processo eletrônico pretende abolir aquela papelada dos processos que entulham nossos tribunais. O advogado se cadastra como usuário do sistema, e envia os processos para o tribunal de maneira digital, escaneando documentos, petições, etc. E acompanha os mesmos via eletrônica.
Pois bem, o amigo preparou a petição, provas e escaneou tudo e colocou no sistema do Tribunal. O processo foi distribuído para uma Vara e ganhou número. No dia seguinte, o amigo para checar se foi tudo correto, entrou no sistema e para sua surpresa viu que o mesmo já tinha um despacho. Animou-se, pois pensou: “É, esta coisa realmente funciona, e agilizou a justiça”.
Foi ler o despacho e o no mesmo constava que estavam com dificuldade de ler o material enviado, por falta de nitidez. O meu amigo assustou-se e foi ver o processo via internet. Estava lá tudo claro como água.
Chateado, foi ao Tribunal, pois se usava o processo eletrônico, não contava com esta ida ao local. Só esperava ir lá no dia da audiência a ser marcada. Chega lá, vai na secretaria da Vara e pede para falar com alguém da secretaria que lançou o despacho do Juiz. A pessoa que lançou o despacho mostra na tela do computador que tudo estava muito pequeno e quase ilegível.
O meu amigo quase caiu pra trás, e se segurou para não morrer de rir. O sistema implantado usa um leitor de PDFs bem conhecido e como qualquer software de leitura pode aumentar o texto, via um local apropriado na barra de ferramentas do software. No caso da pessoa do tribunal, o leitor estava em 20%. O meu amigo mostrou para a pessoa que ela poderia aumentar, para 100%, por exemplo. A pessoa quase caiu para trás, ante tal maravilha da tecnologia!!!
Resolvido este problema de grande tecnologia, meu amigo achou que o problema estava resolvido. Mas, isto é Brasil, terra onde o non-sense impera. O atendente fala que, como já havia um despacho dizendo que o processo estava ilegível, ele teria que contra peticionar nos autos para esclarecer o problema.
Meio que na galhofa, meio chateado, meu amigo peticionou explicando e dando uma aula de como o software de leitura de PDFs funcionava, fazendo um manual de operação.
Não acham que esta história dá inveja ao pessoal do Python?
Digam-me: Isto não é um primor de maluquice e de falta de treinamento, de quem recebe, via impostos, uma grana preta para funcionar bem, e treinar todos que lá trabalham? Hardware bom e software sofrível.
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Ambas histórias são exemplos de mal funcionamento de nosso software do setor público. Investimos em máquinas e equipamentos, mas não treinamos quem vai operá-los. Perda de nosso tempo e da eficiência geral. E isto é feito com o dinheiro de nossos impostos.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

REFLEXÕES SOBRE A JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE (JMJ)


O Papa engarrafado
- o Papa sentiu o que é ser carioca; e ver pela TV a quantidade de ônibus à frente da comitiva papal, foi de dar pena;
- a segurança não estava preparada para isto, todos (segurança pessoal e guardas de trânsito não portavam intercomunicadores;
- me pergunto: porque deram o feriado a partir das 16:00, se esta era a hora de chegada do Papa no Galeão? Quem anda de ônibus e percorre o Rio a pé, de carro, ou qualquer outro meio de transporte público, sabe que o percurso médio entre casa e trabalho é de mais de 1 hora. Ou seja, qualquer que fosse o trajeto, o Papa ficaria engarrafado em algum lugar.
- mais ainda: como alertamos na série sobre os ônibus do Rio cruzando o Centro – o Rio é o único lugar do mundo onde isto acontece – era óbvio que teriam muitos ônibus no Centro do Rio na hora em que o Papa cruzasse o Centro.
- Reparei, também, que as motos que escoltavam o Papa eram da Polícia Rodoviária Federal. Bonitas, imponentes, tudo Harley Electra Glide. Ok, mas os caras patrulham rodovias, não conhecem a cidade e quem tinha que estar ali eram motocas da PM (ou a Guarda Municipal), com suas 250 cc pequenas, mas manobráveis em uma cidade. E a PM (ou a GM) não iria errar de pista, conforme informaram.
- Conclusão: quem decide as coisas no Rio há muito deixou de usar transporte de massa e se desloca, quando de carro, com sirenes e batedores, para desengarrafar o trânsito a sua frente. Ou houve choque de egos, e quem não mora na cidade resolveu planejar o evento.

Quarta-feira (25.7) tranquila
- Pela manhã, levei menos de 2 minutos entre a Barra e a entrada do Túnel Rebouças na Lagoa. Eram 7:30 e parecia sábado na mesma hora. Reparei que tinham muitos carros nas ruas, mas a fluidez do trânsito era porque não haviam ônibus rodando. Os pontos à margem da Lagoa Rodrigo de Freitas estavam apinhados de pessoas. Realmente, Secretário de Transportes e empresas de ônibus estão abusando da paciência da população, ou endoidaram de vez.
- A turma do meu escritório reparou no mesmo, e é gente morando na Barra, Tijuca, Niterói e Grajaú. Aparentemente, aconteceu em toda a cidade.

O MICO do Metrô e a falta de planejamento; a CEDAE pode estar indo pelo mesmo caminho
- Quem já trabalhou em grande empresa, e principalmente na área financeira, sabe que nas vésperas de fim do ano, têm que adotar determinadas medidas, visando, entre outras coisas, ao fechamento do balanço da empresa. Ou seja, marcam-se datas para fazer-se os últimos pagamentos e recebimentos do ano, datas de expedição e entrada de mercadorias, etc. Tudo para evitar que sejam feitas nos últimos dias do ano.
- Em grandes eventos, tipo o Carnaval, o Ano Novo na Praia de Copacabana, ou mesmo uma visita de Papa, algumas medidas têm que ser adotadas. E uma das principais é pedir-se aos concessionários de serviços públicos que não façam grandes obras, ou interrompam as em andamento, para que não ocorram coisas que afetem o fluxo das pessoas ou prejudiquem os eventos.
- O Metrô do Rio resolveu fazer o que seria uma pequena interrupção na sua rede elétrica, nas cercanias da futura estação da Rua Uruguai, para proceder a instalação da rede elétrica da mesma. Esta foi a explicação que deram no dia seguinte.
- Por um aparente erro de operação, desligaram a rede inteira e a cidade ficou sem a sua única linha de metrô por quase 3 horas, prejudicando o fluxo de peregrinos que iam para Copacabana assistir à inauguração da JMJ. Foi o caos na cidade.
- Será que é preciso lembrar aos concessionários que tais coisas não devem ser feitos nestes períodos de grandes eventos? Será que a Prefeitura esqueceu de lembrar isto?
- Não foi por urgência na conclusão das obras na estação Uruguai. Esta estação está prevista desde o projeto original do metrô do Rio, cujas escavações começaram em 1967. Por mais uma semana de atraso, a população da Tijuca não vai reclamar. Já esperaram mais de 40 anos, esperariam mais uma semana.
- E hoje (26.07), ouço que a CEDAE vai fechar o abastecimento de água no próximo domingo (e a obra vai até o fim da 2a feira) para a Ilha do Governador e áreas do entorno do complexo de favelas da Maré, para obras em uma sub adutora, para permitir a conclusão do traçado do BRT ligando a Barra da Tijuca à Ilha do Governador. Idem, idem. Não dava para fazer depois? Na 2a feira milhares de ônibus de peregrinos estarão deixando o Rio, usando as Linhas Amarela e Vermelha, próximas ao local onde farão as referidas obras. Se acontece algum problema nesta hora, como vai ser?  Rezemos e peçamos ajuda ao Papa para que nada aconteça, pois só com ajuda divina ante a tanta imprevidência.

Ônibus de novo
- Li nos jornais e ouvi nas rádios os dramas de quem tentou sair de Copacabana ao final da inauguração da JMJ, na última 3a feira. Problemas no metrô e falta de ônibus. Será que a Secretaria de Transportes não poderia dizer às empresas de ônibus para que estas operem em força máxima?
- Aliás, acabei de ouvir no rádio que estas estão pedindo à Secretaria de Transportes para operar na força máxima. Fico pensando – tem que pedir? Ou é a total falta de bom senso? Todo mundo já está cansado da baixa qualidade dos ônibus e as empresas ficam fazendo vista grossa para a situação que é delas mesma.

O vexame de Guaratiba
- Todos viram que o encerramento da JMJ se daria em Guaratiba, em um imenso descampado, que foi lindamente preparado para a festa de encerramento.
- Só que nos últimos dias choveu muito no Rio e a área ficou inundada e transformada em um imenso lamaçal.
- Para quem não é do Rio ou não estudou a geologia da cidade, a referida área e a maior parte da baixada de Guaratiba é de solo turfoso, pois a área é repleta de manguzais. Aliás, guaratiba em tupi guarani significa ajuntamento de aves, pois o local é repleto de garças, ave aquática. Concluo que é um aterro recente, em termos geológicos (pela natureza) ou recente mesmo, pela mão do homem.
- Ou seja, choveu ou dá maré alta, a probabilidade da área inundar é muito grande. Além disto, pelas fotos publicadas nos jornais, o terreno não deve ter nenhum caimento. Qualquer pedreiro ou mestre de obras sabe disto.
- E na Prefeitura do Rio, no seu serviço de cartografia do Instituto Pereira Passos, tem a cidade inteira mapeada, com curvas de níveis e as ruas da cidade. Eu mesmo tirei uma cópia outro dia, de uma área da cidade. As curvas de nível do local indicariam que a área escolhida não tinha caimento ou era de manguezal.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

O PAPA FICOU NO ENGARRAFAMENTO (ou Apertem os cintos, o comandante sumiu)


O Papa chegou ao Rio e foi brindado com um típico dia do trabalhador carioca, ou seja, com um monumental engarrafamento de ... ônibus.
Todos, que acompanharam pela TV, viram a tremenda gafe de organização e de falta de segurança. Vou deixar para comentar isto e um outro fato daqui a pouco.
Mas como sempre diz o economista Sérgio Besserman, um observador muito atento a diversas coisas, o brasileiro gosta de focar no “hardware” e sempre se esquece do “software”. Quando o Besserman fala de hardware e software não está se referindo à lógica dos computadores. Eu já escrevi aqui no blog sobre a mania brasileira de olhar os ativos tangíveis, aqueles que todos veem, e se esquecem de atentar para quem vai operar o ativo.
A nossa Prefeitura construiu há cerca de ano e meio o famoso Centro de Controle de Operações, que fica numa rua ali atrás da sede da Prefeitura, o famoso Piranhão. Se vocês observarem bem, repararão que nas principais vias da cidade e de seus cruzamentos existem uns postes de aço galvanizado bem altos com câmeras lá no topo. Estas câmeras se ligam ao tal Centro de Controle de Operações. Então, o hardware existe, a tecnologia é de ponta, segundo me contaram alguns amigos que participaram da montagem da coisa.
Mas, e o software? Aquele carinha que vai estar lá na rua, e que teoricamente deveria estar recebendo instruções da coisa? Lembrei-me de uma professora de faculdade, funcionária pública de carreira e aluna dileta de Hélio Beltrão. Ela ajudou o Ministro na restruturação dos Correios, na sua automação, na criação do CEP, etc. Esta professora falava que o maior problema em qualquer correio do mundo era “a milha final”, pois por mais que os correios se automatizassem, a milha final sempre dependeria do homem. Se este falhasse, não adiantaria nada o Correio ter se modernizado e a imagem de desorganização do mesmo continuaria. Agradeço a esta professora os primeiros conceitos sobre hardware e software, no seu senso mais amplo.
Ter o equipamento, mas não treinar que vai executar a solução do problema no local do mesmo, é jogar dinheiro fora. Mas ainda, sem ter um comando e planejamento centralizados, de nada adianta ter equipamentos.
Fora o que se viu na TV, relato um fato interessante pelo qual passei e presenciei. Nos meus deslocamentos casa (Barra) ao meu escritório (Centro), uso um caminho heterodoxo. Subo a Estrada das Furnas, pego a Estrada do Corcovado (em direção às Paineiras) e desço por Santa Tereza. Faço o percurso em menos de uma hora, quando outras pessoas, por carros, levam mais de hora e meia e às vezes, mais de duas horas. Hoje, pela manhã, fiz o caminho de sempre, e a única coisa diferente foi o maior número de turistas, todos com camisas da Jornada Mundial da Juventude.
Na volta, 17:30, subi Santa Teresa, passei por uma viatura da PM no Silvestre e subi a Estrada do Corcovado. Em frente ao Hotel das Paineiras, a cancela da estrada estava fechada. Havia uma viatura da PM e perguntei ao soldado o que havia. Ele me informa que, devido ao grande número de peregrinos que transitava pela estrada, o diretor do Parque Nacional da Tijuca mandou fechar o mesmo por volta de meio dia. Perguntei de novo, se era por segurança, já que o Papa iria se alojar na casa do Arcebispo, no Sumaré. O guarda falou que não. Eu perguntei se ele não poderia avisar aos colegas que estavam na entrada do parque, no Silvestre, para que fechassem o acesso mais abaixo, evitando que mais pessoas fizessem o que eu fiz. Resposta dele: “O pessoal lá de baixo é da UPP”. Eu resolvi parar de perguntar, porque isto não faz sentido.
Desci e no entroncamento com o Mirante Dona Marta tinha outra viatura e uma soldada da PM, ante o que eu contei, desceu até o Silvestre e fechou o acesso. Parabéns a esta soldada.  Faço um parênteses – sou contra o total linchamento que fazem com os soldados da PM. Eles são o software, mal pagos e mal treinados que temos. É burrice execrá-los. Temos que cobrar investimentos no treinamento e no salário deles. Mas, todos os PMs ali
E para terminar:
- Onde está o comando centralizado da coisa? O diretor do parque, que é federal, decide fechar o mesmo por acúmulo de gente e pronto. Fica por isto? Quem manda nele? Ou ele decide tudo sozinho?
- Se fecharam por razões de segurança, poderiam ter fechado 4,5 km acima, na confluência das Estradas das Paineiras, Corcovado e Sumaré. Sei a distância porque em 1984, participei da marcação de “nosso campo de treinos” de verão, nos preparativos da clínica da maratona do Rio, patrocinadas pelo JB.
- O engarrafamento do Papa foi ridículo. Vi quando a Rio Branco foi fechada, às 15:00, porque estava indo pegar uns documentos no Hotel Windsor Guanabara. Já estava um caos, mas imaginei que iriam desviar os ônibus da pista lateral, para a pista central da Presidente Vargas, na altura dos prédio dos Correios. Isto deveria ter sido feito também às 15:00. Não fizeram.
- Quem planejou isto não mora no Rio, ou anda de helicóptero e não sofre com os engarrafamentos.
- E por fim – repararam que os seguranças do Papa não tinham rádios? Nem os guardas de trânsito da CET Rio, nem os guardas Municipais, nem os PMs que estavam ao longo das ruas? Como fazer segurança, ou executar um plano de segurança sem que “a milha final” esteja equipada ou treinada para tal?
A improvisação foi grande, um diretor de parque fecha uma via importante (muita gente está fazendo o caminho que eu faço), e espero que o que ocorreu hoje sirva de lição para a Copa do Mundo e para as Olimpíadas.
Com relação ao Parque Nacional da Tijuca. Se é verdade o que os PMs me falaram, o INEA tem que dar um puxão de orelhas nele. O local é turístico e nos eventos que virão, o local vai ser muito visitado. E aí, encheu e fecha?
Vamos ao bordão já famoso: Imagina na Copa!