terça-feira, 26 de junho de 2018

TRIBUTOS BRASIL X PORTUGAL Alguns contrastes e algumas semelhanças

Saindo um pouco do turismo e o verão português, comento alguns aspectos da tributação no nosso país e em Portugal. O assunto me parece interessante em função do momento em que vivemos, e também pela necessidade inadiável do nosso país efetuar mudanças estruturais com relação a tamanho de estado (o denominador da fração), a uma reforma tributária séria (o numerador da fração) e a questões das políticas públicas face aos desafios presentes e futuros da nossa sociedade (o resultado da fração). Alguns poderão achar que estou sendo simplista, mas a boa e velha aritmética, nossa velha esquecida de primeiros anos de escola, sempre ajuda a explicar algumas coisas.
Resolvi focar como exemplo 3 produtos de consumo (cerveja, cigarro e combustíveis), impostos sobre patrimônio e doações, impostos sobre dividendos e a tributação envolvida nas folhas de pagamento de empresas. Acredito que são exemplos que afetam toda uma população, direta ou indiretamente, nos dois países pelos quais sou apaixonado.
O ponto principal que temos que levar em conta é que existem duas diferenças básicas entre Brasil e Portugal, uma óbvia, envolvida com o sistema organizacional do Estado e a outra temporal. No Brasil, são 3 as esferas que podem cobrar impostos (União, estados e municípios) fato definido pela Constituição de 1988. Em Portugal, são duas esferas, governo central e autarquias (municípios). Com relação ao fator temporal, o atual sistema tributário brasileiro data da reforma de 1966, com algumas alterações introduzidas pela Constituição de 1988, que ampliou a possibilidade dos 3 entes tributantes criarem e legislarem sobre impostos, taxas e contribuições. Em Portugal, o sistema tributário atual data de 1976, com a promulgação da atual Constituição e pelas mudanças introduzida em fins dos anos 80 do século passado, para adequar Portugal para a sua entrada na União Europeia.
Outra diferença básica, entre Brasil e Portugal, é que o atual sistema tributário brasileiro permite a cobrança de imposto sobre imposto, e com a diferença de tributação entre estados e municípios, torna-se muito difícil apurar efetivamente o quanto de imposto se paga em cada produto. Nas comparações que farei a seguir usei duas fontes de informação. O IBPT – Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação e para Portugal os dados são da AICEP (agência do governo português) e da Fundação PORDATA.
Segundo dados da OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico) para 2016, a carga tributária do Brasil é de 35,4% do PIB enquanto em Portugal este número está em 34,4%. O Brasil possui mais de 50 tributos, taxas e contribuições, enquanto em Portugal possui somente 13 impostos, taxas e contribuições.
O cálculo dos impostos em Portugal é mais simples do que no Brasil, sendo que o número de informes e obrigações acessórias que se prestam ao governo são também muito menores. Resultado – ponto a favor de Portugal.
A tributação da cerveja no Brasil, conforme o IBPT varia de estado para estado, por conta principalmente do ICMS. É de 35,52% no Rio, enquanto é de 41,11% em SP e 40,7% em MG. Em Portugal, além do IVA (imposto sobre o valor agregado) nas vendas, é cobrado um dos impostos especiais, o IABA (imposto sobre álcool e bebidas alcoólicas), que varia de acordo com o teor alcoólico da bebida produzida. Em média, o chopp (imperial em Lisboa ou Fino no Porto) tem 26% de imposto; fiz este cálculo, porque o IABA é cobrado por hectolitro produzido e levei em conta o preço ao consumidor de um chopinho. Chopp mais forte, mais caro e mais imposto pago.
Aos fumantes, cigarro é caro em qualquer lugar da Europa por conta dos impostos (altos para fumo em qualquer lugar do mundo). A exemplo das bebidas alcoólicas que têm taxação mais alta a medida em que o teor alcoólico da bebida é maior, o mesmo acontece com o cigarro em Portugal. A taxação em Portugal, além do IVA, também tem um dos impostos especiais, o IST (imposto sobre tabaco) que tem uma parcela fixa e outra variável, cobrado por grama de tabaco, e quanto mais teor de nicotina e outros componentes do cigarro, maior a parcela variável. Desta forma, o fumante português paga em torno de 72% a 85% do preço do produto. No Brasil este imposto situa-se na faixa de 80% do preço final. Decretamos empate neste quesito, com um benefício para Portugal, pois em tabaco e álcool são praticadas políticas tributárias com foco em políticas públicas de saúde, penalizando quem fuma cigarros mais “fortes” e bebidas alcoólicas idem.
Combustíveis é um outro exemplo da atuação de políticas públicas em Portugal. No Brasil, a taxação média (de novo, as diferenças no ICMS dos estados), segundo dados da Fecombustíveis, a gasolina tem 43% de impostos, o diesel 27% e o etanol 26%. Já em Portugal, além do IVA, são cobrados o ISP (Imposto sobre petróleo) e a CSR (contribuição de serviços rodoviários), instituída a partir de 2007, para a manutenção das estradas vicinais e as antigas rodovias nacionais, que ficaram na mão do Estado Português, pois as novas autoestradas que rasgam o país são quase todas privadas e com pagamento de pedágio. O português paga em média 62,6% de impostos na gasolina e no diesel é de 55,11%, com um dado que é o fato de que a parcela variável do ISP, e a CSR de veículos a diesel (gasóleo) ser maior do que os veículos a gasolina, já que Portugal quer eliminar a venda de autos a diesel a partir de 2025. Ponto para o Brasil, menos impostos nos combustíveis, mas com um agravante que é a nossa falta de políticas públicas na substituição do diesel, principalmente nas frotas de ônibus urbanos. Poderiam estar rodando com gás natural, o que já acontece em Portugal.
Tributos sobre heranças e doações é um aspecto de semelhanças no Brasil. Em Portugal, atualmente não há tributação sobre heranças e doações. Existe somente a cobrança do imposto do selo (10%) no recebimento de heranças e doações por irmãos e outros. No caso de recepção por cônjuges e filhos há a isenção do imposto. No Brasil, a alíquota de tais impostos, cobrado pelos estados, foi recentemente aumentada para 8%, sendo que não há isenções para herdeiros diretos. Gol de Portugal.
Com relação a dividendos, a tributação brasileira isenta os dividendos de tributação. Já, em Portugal, a tributação de dividendos para as pessoas físicas (IRS – IR singulares) é de 28% e para as pessoas jurídicas (IRC -  IR – coletivas) é de 25%. Ponto para o Brasil.
Ressalto que os dois  países não tem taxações explícitas sobre heranças ou patrimônio. Existem apenas as taxações sobre veículos e imóveis, comum aos dois países.
No caso dos custos trabalhistas, Portugal leva vantagem. A quantidade de encargos, tributos e custos acoplados na folha de pagamento brasileira, é maior do que a portuguesa. Isso, apesar de Portugal ter um 14º salário por conta das férias e no Brasil esse salário de férias é de 1/3 do salario mensal. O Brasil, em média, tem custos acoplados a folhas de pagamento da ordem de 72% e os de Portugal são da ordem de 60%.
O ponto final é que são sistemas muito distintos, com um número de impostos muito menor em Portugal, e que o sistema português é mais simples do que o brasileiro. Também, a visão tributária portuguesa, além do fator arrecadador, tem uma visão focada em políticas públicas de cunho, na maior parte, compensatórias.

segunda-feira, 4 de junho de 2018

LISBOA, A PÉROLA DE PORTUGAL *

Conheci Lisboa há 8 anos atrás. Para mim, a cidade era o que descrevia a música Lisboa Antiga, cantada pela grande Amália Rodrigues. Mas, nessa primeira ida a Portugal resolvi seguir os conselhos do amigo Sérgio Leite que andou por lá uns bons 15 anos.
Lisboa é realmente uma cidade magnifica, onde o antigo e o novo se mesclam harmoniosamente. E, apesar das colinas íngremes, é uma cidade gostosa de se caminhar. 

E como eu gosto de caminhar, segue uma sugestão que, se bem aproveitada dura um dia. Vá passear no Parque Eduardo VII e apreciar os jardins e a beleza do local. A seguir, desça pela direita do parque e aprecie a Rotunda do Marques de Pombal. A estátua ali colocada é uma justa homenagem à pessoa que comandou a reconstrução de Lisboa depois do terremoto de 1755, um dos cinco maiores terremotos já catalogados pelos geólogos (estimativas de intensidade chegando a 8,9 na escala Ritcher), que só discutem até hoje se ocorreram 7 ou 9 tsunamis pós terremoto, com ondas de mais de 30 metros na costa próxima a Lisboa. Morreram cerca de 30% da população da cidade que contava com cerca de 300 mil habitantes. Cerca de 85% das construções da cidade foram arrasadas e o Marques de Pombal comandou esta reconstrução, da cidade e do sul do país. 
Rotunda do Marquês, com o parque Eduardo VII ao fundo

E a obra desta reconstrução pode ser admirada ao se caminhar pela Avenida da Liberdade, que liga a Rotunda do Marquês à Praça dos Restauradores. Esta avenida foi originada no século XIX, em cima de um caminho chamado de Passeio Público, originado da reconstrução pombalina. A sensação de caminhar nesta avenida é a mesma de se caminhar em qualquer boulevard parisiense ou de outra grande capital europeia. O bom é que a avenida desce em sentido do Rio Tejo, com uma inclinação muito suave. Aproveite para apreciar lojas, jardins, belas construções e os cafés. Se não estiver cansado, vá até a beira do Rio Tejo, passando pela Rua Augusta e dê uma parada no Museu Nacional de Arte Contemporânea. Ali ocorrem sempre boas exposições. E por fim você chegará na Praça do Comércio, onde se situam diversos prédios públicos, oriundos da reconstrução de Lisboa. Aprecie a vista do Rio Tejo e tire bastante fotos ao longo do caminho, pois tem muita coisa interessante para se fotografar e rememorar.
Outro passeio interessante é pegar o carril (bonde) perto da Praça do Comércio e subir até o Castelo de São Jorge, visitar o castelo, subir na famosa Torre do Tombo e apreciar a vista da cidade, que é magnifica. Um detalhe de infraestrutura: repare na quantidade de placas fotovoltaicas (solares) nos telhados de prédios e casas. A geração distribuída de energia é uma realidade em Portugal, gera-se para consumir e o excedente é vendido. Portugal investe firme nas energias renováveis.
Outro museu muito interessante de ser visitado é o Museu da Fundação Gulbenkian, que abriga a coleção de arte do magnata do petróleo armênio Calouste Goulbenkian. A história da ida de Gullbenkian para Lisboa é um capítulo à parte e quem tiver curiosidade pode ler Lisboa – A Cidade Vista de Fora e Lisboa – A Guerra nas Sombras, ambos do inglês Neill Lochery, que dá uma aula de Lisboa. E o parque que envolve o museu também merece ser visitado.
Uma experiência inesquecível é visitar o Oceanário de Lisboa e caminhar no seu entorno, o Parque das Nações. O oceanário tem uma arquitetura ultra moderna, e, pra mim é uma experiência sensorial incrível. Sensorial e reconfortante. Sai-se de lá mais leve, uma certa sonolência, mas extasiado com a magnitude do local. Pra mim, que já fui lá duas vezes, é uma coisa indescritível.
Outro passeio tradicionalíssimo é visitar o Mosteiro dos Jerônimos, onde se encontra o túmulo de Vasco da Gama, visitar a Torre de Belém, e depois, bem depois, empanturrar-se à tripa forra (salve Eça de Queiroz) de cafés e pastéis de Belém. O café e restaurante que é dono do nome e da fórmula original desta iguaria típica fica neste caminho. Prepare-se para as filas, tanto para um cafezinho e um pastel, como para fazer um almoço no restaurante. Pelo que me lembre, não fazem reservas.
Uma dica com relação a cafezinho em Portugal. Sempre peça seu cafezinho cheio, se não, vem a xícara com café pela metade, pois é hábito português beber o café o mais forte possível, com um ou dois pequenos goles.
E para terminar, 3 dicas para jantares. O tradicional Solar dos Presuntos que tem seu forte nos frutos do mar. O afamado Pap’Açorda é outra pedida, saiu do Bairro Alto e agora está no reformado Mercado da Ribeira Nova, no Cais do Sodré e reserve um lugar no seu estômago e peça com sobremesa a mousse de chocolate, que é indescritível e muito famosa. Se você gosta de champanhes, vá na Champanheria do Cais, também no Mercado da Ribeira Nova. E por fim, para uma outra experiência indescritível, vá ao Mini Bar, do chef José Avilez, uma das revelações da nova cozinha portuguesa, fica no bairro do Chiado.
Dois conselhos para quem vai à Lisboa. Recomendo, para todos os restaurantes citados, fazerem reservas com uma certa antecedência. E, esqueçam o carro. É impraticável fazer turismo em Lisboa de carro, poucos estacionamentos e todos muito caros. Ande a pé, de metrô ou de taxi, ou mesmo os veículos de aplicativos.
E boa viagem à Lisboa para todos. 

* Publicado no Jornal do Brasil em 04.06.2018