domingo, 7 de julho de 2013

A OPÇÃO PELOS ÔNIBUS – 3 (Porque o Centro do Rio não deve ser depósito de ônibus)


Esta comentário é o último da série. E onde apresentamos a distorção que se deu nos últimos10 anos na dinâmica dos deslocamentos dos transportes de massa no Centro do Rio.
Os Anos 1940
O Centro do Rio permaneceu sem grandes mudanças, a partir das modificações verificadas com o desmonte do Morro do Castelo (1920), e com os aterros da Ponta do Calabouço (aeroporto Santos Dumont e Av. Beira Mar) e do Saco da Glória (Largo da Glória e Praça Paris).
No início da década de 1940, introduz-se uma grande transformação no acesso Norte do Centro, com o prolongamento das alamedas laterais do Canal do Mangue até a Igreja da Candelária, com a abertura da Av. Presidente Vargas. Foram demolidas mais de 500 construções, e acabaram-se o Largo do Capim e a Praça XI de Junho, bem como as ruas General Câmara e de São Pedro.
A lógica da abertura da Av. Presidente Vargas já era prevista no Plano Agache, pois entendia-se que a abertura desta via facilitaria os acessos ao Centro. E, também, facilitaria a circulação dos transportes de massa.
A abertura da Av. Presidente Vargas não alterou o eixo do deslocamento para o Centro, pelo seu lado Norte, mas aumentou a mobilidade, pois a Candelária passou a ser atingida por uma avenida com amplas pistas ao contrário de ruas estreitas do período colonial. Os bondes continuaram com seus trilhos pela lateral da nova avenida que era a antiga rua General Câmara.
Em paralelo, e como curiosidade (por enquanto), é construída a Av. Brasil, como uma forma rápida de deslocamento para se atingir as estradas que ligavam o Rio a Minas e a São Paulo. A Av. Brasil foi construída, na sua parte inicial (São Cristóvão, Cajú e Manguinhos), em cima de grandes aterros. Para quem não sabe, a saída da cidade para as estradas que ligavam o Rio e São Paulo se dava pelas Av. Suburbana e Estrada Automóvel Clube até Campo Grande, ligando-se à antiga Rio – SP, que hoje é a estrada que corta o Município de Seropédica. A Av. Brasil coloca o fluxo de veículos dos subúrbios e das cidades da Baixada Fluminense no eixo das avenidas Rodrigues Alves e Francisco Bicalho.
Outro fato que alterou a dinâmica do Centro, no entorno da Praça Mauá, foi a construção da Rodoviária Mariano Procópio, que ficava nos fundos do Prédio da Polícia Marítima e do Palácio D. João VI, hoje o MAR- Museu de Arte do Rio. Os ônibus interestaduais e que vinham da Baixada Fluminense faziam pontos nos entornos da Praça Mauá, transformando a Rua Sacadura Cabral e Av. Venezuela em depósitos de ônibus. O Touring Club, que já administrava o terminal de passageiros dos transatlânticos que chegavam ao Rio (única forma de se chegar do exterior, pois uma viagem de avião Nova – Rio levava 3 dias), propôs construir um terminal naquela área. Em 1950 o terminal foi inaugurado.
Rodoviária Mariano Procópio
Todos os fatos mencionados não mudaram a dinâmica de acesso, mas aceleraram o tempo de chegada ao Centro. E os pontos de parada continuavam a ser o lado sul para quem chegava por este lado e o norte para quem vinha deste lado.
Os Anos 1950
Outra grande transformação ocorreu por volta de 1955, o desmonte do Morro de Santo Antônio. Tal desmonte já era previsto no Plano Agache, que também sugeria que o Canal do Mangue fosse expandido até o antigo Cais Pharoux, na altura de onde hoje é o Restaurante Albamar. Ou seja, as atuais avenidas Henrique Valadares, Chile e Almirante Barroso seriam o prolongamento do Canal do Mangue. O desmonte do Morro de Santo Antônio possibilitaria fazer esta via prevista no Plano Agache, só que de forma rodoviária e não aquaviária. O engraçado é que poderíamos ter peniches como no Rio Sena, ou no Regent’s Canal (Londres). Esta via redundou nas vias acima citadas, sendo que o eixo de deslocamento só não ficou completo, pois existe uma garganta na Rua da Relação entre a avenida Gomes Freire e a Rua do Lavradio.
De uma certa forma, o eixo sul – norte foi quebrado com uma entrada pelo oeste do Centro.  Com o desmonte do Morro de Santo Antônio, a estação dos bondinhos de Santa Teresa mudou-se da Rua da Carioca 1, para o local que está até hoje, nos fundos da sede da Petrobras.
Outra alteração na circulação do Centro do Rio foi a demolição do Mercado Municipal, construção em estilo vitoriano toda em estrutura de ferro fundido. O mercado Municipal ficava em frente à Praça XV e ao Cais Pharoux. Foi demolido e a operação do entreposto foi transferido para o bairro de Benfica, para o local que todo carioca conhece como CADEG – Central de Abastecimento da Guanabara. A demolição deveu-se à construção da Av. Perimetral, no seu primeiro trecho, da Av. General Justo até a Candelária.
Veja abaixo a foto do antigo Mercado Municipal com alguns pilares da Perimetral já construídos.

Estas duas mudanças fizeram que o Centro do Rio ganhasse um acesso pelo seu lado leste e uma via elevada que, quando totalmente construída, cruzaria o Centro por cima, sem necessidade de cruzar as vias do mesmo. É importante ressaltar que estas vias privilegiavam os veículos motorizados, ou seja, ônibus e carros.

Os anos 1960
Nesta década, em 1961, a cidade deixou de ser a Capital Federal e se tornou uma cidade – estado, o Estado da Guanabara. Planos viários engavetados há décadas, bem como um novo plano para a cidade foi contratado a uma consultoria do urbanista grego Constantino Doxiadis. São deste plano as Linhas Vermelha e Amarela. Ele previa outras linhas (mais quatro cores) e ficou conhecido como Plano Policromático.
São do início dos anos 60 a conclusão do Túnel Santa Bárbara (1962) e da primeira galeria do Túnel Rebouças (1965). O impacto para a cidade foi imenso, já que nos deslocamentos sul-norte (e vice versa) não mais era necessário circular pelo Centro da Cidade, contornando o maciço da Tijuca. O encurtamento das distâncias e a diminuição do tráfego no Centro foi muito grande.
Mas a derrocada dos sistemas de transporte de massa começa nesta década. O sistema de transportes de massa baseado em trilho, os bondes são desativados. Na Zona Sul do Rio, o bonde para de circular em 1962. Na Zona Norte e subúrbios de 1964 a 1966 e o último bonde a circular é o da linha que subia da Usina ao Alto da Boa Vista, em 1968. Restou o bondinho de Santa Teresa, que hoje em dia está paralisado por conta de inúmeros acidentes.
O assunto sobre o porquê do fim dos bondes será objeto de um post futuro.
Foi feita uma tentativa de se usar ônibus elétricos que haviam sido importados da Itália em fins dos anos 50, e apodreciam estocados no porto. Os mesmos começaram a circular na Zona Sul em 1964 e na Zona Norte em 1965. Foi aproveitado um terminal rodoviário que existia na Esplanada do Castelo, que funcionava para as primeiras linhas de ônibus que vinham da Zona Sul. Vemos que até esta época a lógica de acesso sul e norte ainda continuava. Este terminal foi demolido por volta de 1968 e em seu lugar foi construído o Terminal Menezes Cortes, inaugurado em 1974. A experiência com os ônibus elétricos foi desastrosa e os mesmos foram reconvertidos para motores a diesel e a cidade passou a ter como transporte de massa somente os ônibus.
Outra construção que impactou o deslocamento da Cidade foi a construção da Rodoviária Novo Rio (concluída em 1965), na confluência das avenidas Francisco Bicalho e Rodrigues Alves. O motivo desta construção foi o estouro da capacidade da Rodoviária Mariano Procópio, na Praça Mauá. Desta forma, os ônibus interestaduais passaram a estacionar nesta rodoviária, ficando a Mariano Procópio destinada aos ônibus intermunicipais, principalmente os que vinham da Baixada Fluminense e Zona Oeste do Rio.
Mantinha-se a lógica dos corredores Norte – Centro e Sul – Centro, não havendo o cruzamento dos corredores pelo Centro da Cidade.
Os anos 1970 até os dias de hoje
Com o fracasso dos ônibus elétricos, as incipientes linhas de ônibus dos anos 50 e 60, e mais os famigerados lotações das mesmas décadas, se transformaram naas atuais empresas de ônibus. Os lotações, dos anos 40 e 50, eram o equivalente das vans dos dias de hoje, tendo teoricamente uma linha a cumprir. Mas, como as vans, paravam fora dos pontos, mudavam de trajeto e andavam em desabalada velocidade pelas ruas.
Lotação do início dos anos 50 da Linha Santa Alexandrina - Leme
Entretanto, a dinâmica dos deslocamentos entre os bairros da Cidade e o Centro da mesma, mantinham a lógica das linhas dos antigos bondes. Ou seja, tirou-se o bonde e os ônibus assumiram os trajetos antigos. Desta forma, ainda se respeitava a lógica dos acessos e estacionamentos / retornos pelos lados sul e norte do Centro da cidade.
A partir dos anos 1980, esta lógica foi rompida e o Centro do Rio virou ponto de passagem de linhas de ônibus que cruzavam o Rio em todos os sentidos, inclusive vindo da Baixada Fluminense e Regiões Serrana e dos Lagos e estacionando no Castelo. Chegou-se a um absurdo de termos uma linha, nos anos 80 e 90, a Charitas – Gávea que circulava de Niterói, passando pela Ponte, transitava pelo Campo de São Cristóvão, cruzava o Centro, passava pelo Catete e Rua Marques de Abrantes, tendo ponto final perto da PUC. Uma curiosidade – minha filha tinha um colega de Santo Inácio que, vez por outra, matava aula no Charitas – Gávea. A mãe o deixava no colégio às 7:00 da manhã, ele não entrava, pegava o ônibus no sentido Niterói e, chegando em Charitas, pegava um em sentido inverso. Chegava no Santo Inácio, em Botafogo, no horário da saída, às 12:30. Ou seja, uma epopeia esta linha.
Hoje, século XXI, o Centro do Rio e adjacências (Glória, Catete, etc) viraram depósitos de ônibus das 10:00 às 16:00. Também, a maluquice dos trajetos passou a imperar. Ônibus com trajetos do tipo Nilópolis – Glória passaram a existir.
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Conclusão
Eu sei que esta série foi longa e alguns reclamaram. Mas lembro que no início da mesma ressaltei alguns fatos:
1 – A audiência pública do Prefeito no IAB, para discutir um BRS na Rua 1o de Março e o anúncio de página inteira do consórcio do VLT, no dia seguinte. O VLT não é uma coisa firme, minha conclusão.
2 – Reportagem do Globo do ano passado, falando que o Centro fica cheio e engarrafado após às 10:00, e não sabiam o motivo. O motivo é que o Centro do Rio, a partir desta hora em função da demanda que decresce, vira estacionamento de ônibus.  É a única cidade do mundo que tem ponto final em um Centro.
E, na última 6a feira, 05/07/2013, aparece reportagem nos jornais falando que o Prefeito do Rio levará em consideração as recomendações do IAB-RJ, e não teremos BRS cruzando o Centro.
OK, perfeito. Mas:
a) as atuais linhas de ônibus continuarão cruzando o Centro, ao contrário de pararem nas entradas do mesmo? E andando em concorrência explicita com o VLT.
      b) O VLT é mesmo para valer, com todas as linhas previstas? Sai mesmo?
Por que se a lógica prevalecer, os únicos meios de transporte público que teremos no Centro, em futuro próximo, deverão ser metrô, VLT e táxis.
E voltaremos a ter um Centro despoluído, com menos ruído, com mais pedestres nas calçadas.
Vamos observar e vamos cobrar.
Empilhamento de ônibus na Av. Beira Mar - julho/2013

VLT do Rio - concepção artística



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